Salmo 23 – O Salmo do Deserto

por Roberto Soares Feliciano Junior

Provavelmente foi composto a partir de fatos que inspiraram a Davi há relembrar o tempo em cuidava de ovelhas como pastor ou mesmo quando estava peregrinando no deserto por vários motivos: lutando contra os inimigos de Israel, fugindo do rei Saul e depois mais tarde já como rei, fugindo do seu filho Absalão que fez um levante ao seu reinado.

Mas estes fatos estão sempre relacionados com a necessidade de confiar no cuidado e da proteção de Deus. É um salmo de Confiança e Segurança que, lido ou cantado, tinha como propósito de promover nas pessoas: a motivação na certeza da presença do senhor na sua caminhada (vs.1, 3 e 6); na orientação segundo a vontade do senhor (vs. 2-3); na convicção da presença do senhor em qualquer circunstância (vs 4 e 6); na certeza do cuidado e proteção pois o senhor cuida das suas ovelhas (v.5) e na restauração pois Deus conduz para a morada eterna (v.6).

O salmo seria mais bem chamado de o “Salmo do Deserto” e vez somente de o “Salmo do Bom Pastor”, pois é composto a partir da cena de um deserto dividida em duas partes. A cena da ovelha e a cena do homem viajante. Abra a sua bíblia e acompanhe a exposição do salmo.

Nos versos de 1 a 4, a primeira cena, temos a visão da ovelha que é cuidada e protegida por um pastor: “O SENHOR é o meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam”.

Provavelmente o próprio salmista se veja nesta figura da ovelha frágil que necessita de cuidado, proteção e direção. Ela é guiada por um pastor pelos bons caminhos, justos e retos, que somente ele conhece. Portanto, são os melhores caminhos na visão do bom pastor. A ovelha, apesar do deserto, demonstra dependência e confiança no pastor que encontrará o que ela realmente necessita. Ela precisa de sombra e refrigério: comida tenra e água fresca; proteção nos perigos de morte e consolo. Este consolo vem do bordão ou vara, que traz a ideia de ensino, correção e disciplina; e do cajado que representa o cuidado e a direção. O pastor sempre cumprirá com a sua responsabilidade de prover, cuidar, proteger e guiar a ovelha por causa da honra do seu nome, por isso a expressão “por amor do seu nome”.

Hoje, para nós, o deserto pode representar o mundo em que vivemos, ou até mesmo as nossas vidas. Por muitas vezes as nossas vidas são como um deserto árido, seco, insólito, quente, sem vida, que geram o medo, as incertezas e desesperanças. Mas Deus, através de Jesus que é o bom pastor, segundo texto do evangelho de João capítulo 10, nos guia por caminhos que ele julga serem certos e justos para nós, que ao final da jornada encontraremos refrigério para nossa alma, provisão para nosso corpo, proteção das nossas vidas e consolo pelo ensino e cuidado. Nós podemos desejar consolo do Senhor, mas também precisamos do seu ensino e correção para ser cuidado por ele.

Nos versos 5 e 6, a segunda cena, temos a visão de um viajante do deserto que é cuidado por alguém: “Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do SENHOR por longos dias”.

Este cuidador é hospitaleiro, bom e misericordioso, e recebe o viajante do deserto em sua própria casa oferecendo uma mesa de banquete, cuidando de suas feridas com a unção do óleo que na época era usado como proteção do sol escaldante do deserto.

O viajante que percorre e continuará percorrendo um deserto, é tratado como um hóspede de honra. Comer e beber em mesa para quem vivia naquela região tinha um significado de um vínculo de amizade e lealdade mútua, até como um sinal de uma aliança entre o hospedeiro e o hóspede (conf. Ex 24.8-12 e 1Co 11.25). Depois deste encontro que o dignificou como pessoa honrada, o viajante continua o seu percurso pelo deserto com uma diferença: mudou a sua forma de viajar com a nítida lembrança de tudo que experimentou. Passa então a desejar um novo encontro, e a sua memória o lembrará da bondade e da misericórdia com que foi recebido por este que até amigo se tornou e passa a chamá-lo de Senhor. O viajante passa a viver sendo fiel àquele que deu um novo sentido para sua vida no deserto. Esta bondade e misericórdia vivenciada o acompanharão todos os dias da sua viagem na certeza que um dia poderá retornar a casa deste que agora é seu Senhor e permanecer com Ele por todos os dias da sua vida.

Verdade esta que pode ser aplicada em nossas vidas: o homem-Deus, Emanuel, Deus conosco, nos acompanha com sua bondade e misericórdia em todos os dias da nossa peregrinação neste mundo. Jesus Cristo nos diz em Mateus 28.20b que estará conosco até o final dos tempos.

Portando seja como ovelha ou como viajante sempre sentiremos protegidos e cuidados por Deus, que nos dará a cada dia a certeza que quando O reencontrarmos viveremos com e por Ele todos os dias restantes das nossas vidas, pois o fiel que confia no Deus fiel é sempre honrado. Por isso como uma ovelha o fiel diz: “sendo o Senhor o meu pastor não sentirei falta de nada”. E como viajante do deserto dirá no final de sua peregrinação: “habitarei junto do meu Senhor todos os dias da minha vida”. Essa é a nossa esperança. Essa é a nossa certeza.